Os olhos amarelos a miravam com tamanha distinção no meio de tanta gente, tanta coisa acontecendo, que subitamente ela se sentiu invadida.
No meio da rua, ela viu o que não queria ver. Encontrar aqueles olhos eram um sinal de mau agouro porque ela sabia que a vida se tornaria cruel dali pra frente.
Ainda assim, mesmo sabendo da profecia, ela deu de ombros e se foi.
Os dias passaram e nada aconteceu. Nenhuma doença, nenhuma morte na família, nem um machucado sequer. A previsão sobre os olhos amarelos estava errada.
Por isso ela voltou à mesma casa, procurou o mesmo gato e, quando encontrou, passou um bom tempo admirando aqueles argutos olhos da cor da lua ao nascer. Brilhantes e ao mesmo tempo opacos, ela via o próprio espelho na pupila larga e redonda do felino. Ficou hipnotizada. Viu um misto de passado, presente e futuro se tocar na linha imaginária do tempo. E então, por um breve instante de existência mundana e banal, tudo era uma coisa só. E a vida, na sua aleatória falta de sentido, passou a fazer todo o sentido do mundo.
Quando a experiência acabou, ela se foi.
Mas foi só sair da casa que a profecia se cumpriu. A lua caiu e a pobre dama viu seu fim antes mesmo de chegar ao chão.
Seus pensamentos voaram para longe, pesados, impalpáveis, fugidios, pueris. Mas isso ninguém viu. Só o gato.
4 de fevereiro de 2013